Nas altas horas vejo e revejo
Os sombrios contos e seus sinais
A leitura que desejo
De histórias sobrenaturais.
No leito, repousado no conforto
De um tempo vazio em meu lar,
Leio o conto do redivivo morto
Saindo do sepulcro, a atacar.
Então uma dúvida repercute:
Seria tudo isso uma besteira?
É verdade? Ou um embuste,
Ser possível reviver uma caveira?
No quarto mal iluminado,
Apenas uma vela,
Dançam sombras nos umbrais
De súbito, três batidas na janela.
Mas deve ser o vento, nada mais
.Então na cama me remexo,
E o pavor aumenta mais
Pois estava lendo esse trecho
Em que o morto se refaz.
Novamente, para meu espanto,
Ouço mais ruídos infernais,
Mas penso por enquanto:
— É só o vento, e nada mais.
Assim volto à leitura ficcional
Penso que agora terei paz
Porém, a batida sobrenatural
Seria mesmo o vento, e nada mais?
O som terrível vem da porta.
Grito: — Quem bate em meus portais?
Nada. Mas o que importa,
Se é apenas o vento, nada mais.
Mas em um estouro se arrebenta
A frágil porta que me protegia
A visão horrenda atormenta:
Um corpo tomado de hemorragia.
Aos prantos berro em desespero:
— Vá embora, volte aos abismos infernais.
O espectro reage ao meu exagero
E responde num sussurro: jamais
— O que faz em meu recanto?
— Saíste dos refúgios sepulcrais?
— E por que diz em seu canto
Com uma voz sofrida: jamais.
Peço, ajoelho e imploro ao morto-vivo
— Não me mate, sou apenas um poeta
Nada mais
E a criatura sem nenhum motivo
Caminha para o meu lado
Dizendo: Jamais!
Tento fugir do triste fim
Do monstro atroz
De suas garras letais
Mas a sombra cai sobre mim
Me arrasta ao inferno
Sussurrando: jamais, jamais.