Segunda Chance

por Mundo Sombrio
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Perder um filho, com certeza, deve ser a pior dor existente e foi o que aconteceu com Sofia. Seu filho Mike de 8 anos, morrera há alguns meses atropelado, vítima de uma fatalidade. Saindo do colégio correndo, fora atingido por um carro desgovernado, guiado por um motorista bêbado que respondia o processo em liberdade. Sofia nunca se conformou com. Culpava a tudo e a todos, inclusive a si própria pelo ocorrido. Se ela tivesse ido busca-lo no colégio, se ela não tivesse ido trabalhar naquele dia, Mike ainda estaria com ela. Seu casamento não resistira ao golpe, pois também culpava seu marido. Ela acabou por tentar o autoextermínio mas, sem êxito. Se achava tão incompetente que nem acabar consigo mesma ela conseguiu.

Vivia à base de antidepressivos em seu apartamento desarrumado, sujo e necessitando de uma boa faxina. Só o quarto de Mike estava como sempre foi. Seu quartinho azul, seus brinquedinhos, a caminha em forma de carro de Fórmula 1, sua estante com seus bonequinhos de heróis. Seu armário. Suas roupas ainda tinham seu cheiro.

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Sofia passava horas deitada no tapete do quarto de Mike abraçada à sua foto e chorando pela falta do filho. Até que, um dia, nas poucas vezes que saía de casa, andando a esmo pelo centro da cidade, avistou um sebo, uma loja de livros antigos e usados. Ela entrou e começou a examinar as prateleiras. Dentre elas, um livro preto e grosso com letras douradas chamou-lhe atenção. Começou a folheá-lo e notou vários desenhos, como os símbolos de bruxaria de filmes de terror dos quais ela gostava. Até que um dos títulos chamou sua atenção: RESSUSCITAÇÃO. Tratava-se de um livro de feitiços e o texto ensinava como trazer alguém de volta à vida.

Sofia dirigiu-se ao caixa e, ao pagar a mercadoria, o funcionário da loja estranhou, pois não estava cadastrado, mas cobrou-lhe um preço um tanto alto pela grossura do livro.

Ao chegar em casa, a mulher pôs-se a ler atentamente a parte que mais lhe interessava e teve uma ideia: alugou uma casa de campo e, no dia seguinte, animadamente partiu para o local.

Era noite de lua cheia coincidentemente como pedia nas orientações do livro. Ela afastou os móveis da pequena sala, acendeu velas, desenhou no chão um pentagrama e, dentro dele, colocou a foto de Mike e um brinquedo que pertencia a ele assim como descrito no livro. Sofia ficou nua no meio do símbolo e fez um corte profundo no pulso, derramando sangue na foto de seu filho. Enquanto fazia isso, proferia as palavras ensinadas no livro:

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DO MEU SANGUE TU VIESTES, DO MEU SANGUE TU VOLTARÁS!
E dizia com fé , chorando e gritando: “MIKE, VOLTE DE ONDE ESTIVER PARA A MAMÃE!

Então, do lado de fora, um temporal se formou. Tudo escureceu de repente e as velas se apagaram com a força dos ventos que entravam fortemente pelas frestas da cabana. Sofia, ajoelhada dentro do pentagrama, chorava clamando por seu filho e ali adormeceu.

Na manhã seguinte, a mulher acordou e se achou ridícula naquela posição em que estava. Nada aconteceu. Então, limpou aquilo tudo e foi tomar um banho.

Mais uma loucura feita por ela para ter seu filho de volta, e sem resultado algum.

Foi para a cama chorando.

Acordou sobressaltada. Já era noite e ainda chovia muito. Foi quando percebeu um barulho vindo do assoalho de madeira da varanda e algumas batidas na porta. Sofia levantou e foi certificar-se de que não era sua imaginação lhe pregando uma peça. Ao abrir a porta seu coração gelou. Ali, encolhidinho num canto, estava Mike, seu filho. Todo molhado, sujo de terra e bastante pálido. O menino tremia de tanto frio.

— Mamãe, você demorou! Eu estava com medo! Lá é muito escuro! – disse o menino secamente.

Não se aguentando de emoção e felicidade, Sofia abraçou seu filhinho com muita vontade e então tratou de levá-lo para a banheira para dar-lhe um banho bem quentinho.

Ela ficou em silêncio contemplando seu filho, enquanto tirava o excesso de terra de seus cabelos. O menino tinha um olhar vazio.

Mike, já envolvido em seu roupão felpudo sentado à mesa, observava sua mãe que falava, fazia planos de como seriam seus dias dali em diante.

— Você quer panquecas filho? Mamãe vai fazer as suas preferidas!

Mike ouvia sério e calado.

Subitamente, ele se levantou, agarrou uma faca na pia e disse com um brilho estranho no olhar:

— NÃO QUERO ESSA MERDA DE PANQUECA! QUERO BRINCAR DE ESCONDE ESCONDE! – e correu para os quartos gargalhando.

As luzes se apagaram. O ambiente passou a ser iluminado apenas pelos flashes dos relâmpagos. Sofia tremia ao tentar acender uma vela. Andou pela casa vagarosamente chamando pelo filho e o ouvia gargalhando.

— Vem me pegar mamãe!

A mulher ouviu um barulho atrás de um dos móveis.

— Mike! Pare com isso! Mamãe não quer mais brincar!

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O garoto saltou sobre a mãe derrubando-a no chão e cravando-lhe a faca repetidas vezes no abdômen, rosnando e dizendo com ódio naquele olhar totalmente negro:

— EU NÃO SOU O MIKE, SUA VACA!

Sofia então acordou em sua cama, em seu apartamento, assustada e bastante suada.

Sentou-se à cama e disse:

— Meu Deus! Q pesadelo!

Levantou e foi à cozinha, pois, depois daquilo, ela precisava de um café.

Assim que chegou à cozinha, viu sobre a bancada o livro grosso, negro e com letras douradas que havia adquirido naquele sebo no centro da cidade.

Era sua segunda chance…

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