Valdo achou uma afronta aquelas coisas diante da porta de sua nova casa. E não era um despacho qualquer, aliás, não era nem mesmo um despacho. Em comum com o que conhecia, apenas as velas. No meio da coisa havia uma caveira de gesso, flores, pequenos recipientes de vidro, cruzes estranhas e papéis com uma caligrafia estranha.
Antes de comprar a casa, Valdo tinha ouvido por um amigo que por ali existia uma religião satânica. No momento, ele pensou que se tratava de alguma coisa de adolescentes que se limitava a pichações, mas pelo visto a molecada ali era mais ousada. Ele chutou as coisas maldizendo quem quer que tivesse feito aquilo. Um dos recipientes se rompeu e um líquido vermelho sujou seus pés e a calçada. Sangue? Bem, não importava. De qualquer maneira era uma decepção que, naquela cidade, que não era metrópole, tivesse essas coisas.
O amigo que lhe dissera que por ali havia uma religião estranha, também dissera que aquele município era cheio de coisas toscas e pavorosas. O que exatamente, ele não disse. Mas Valdo também não quisera saber. Entrou em casa e tratou de esquecer o assunto.
Durante aquela noite, ele teve pesadelos terríveis e no dia seguinte se sentiu doente. Voltou para casa se sentindo péssimo. Tomou banho, pediu comida e lá pelas nove da noite se sentou diante da TV com uma xícara de chá nas mãos.
Ouviu batidas na porta da frente. Foi lá, mas não havia ninguém. Iniciou-se ali seu verdadeiro calvário. Toda vez que se sentou de frente a TV, as batidas na porta recomeçavam. Chegou a sair na rua, xingando quem quer que estivesse fazendo aquilo. Ameaçou chamar a polícia em alta voz, mas as perturbações continuavam. Começou a se sentir com febre e a se sentir observado. Desmaiou e quando acordou caído no meio da sala, teve certeza de que alguém estava dentro de casa. Olhou em direção à porta da frente e viu três espaços de luz vindo da fresta embaixo da porta. Algo dividia a luz, duas coisas que não estavam lá antes. Que se moveram… Pés? Sim, dois enormes pés e Valdo sentiu um calafrio terrível.
Um ser enorme ao qual podia ver apenas o contorno na escuridão, vindo em direção a ele. Podia sentir a respiração daquela coisa e seus passos lentos faziam parte do seu terror. O que ele devia fazer? Se levantar e correr? Óbvio, mas se sentiu paralisado como um personagem estúpido de um filme de terror B.
Fez um esforço, porém ao se erguer um tanto, o monstro correu, o alcançou em três segundos e o chutou no peito. A dor lancinante também tirou seu ar e ele foi arremessado ao ar alguns centímetros. Caiu no chão, arquejante, pensando que era o seu fim. Se a besta o chutasse mais, ele morreria. Tinha certeza.
A coisa se aproximou. Tinha uma cabeçorra enorme, redonda e descarnada, quase uma caveira… Soltou um urro e Valdo afundou numa inconsciência bem-vinda. Mesmo que fosse a morte… Mas ele não morreu.
Acordou no outro dia e foi ao médico. Tinha três costelas quebradas. Voltou para casa temeroso. Abriu a porta devagar coim o coração aos pulos… E então viu o chão coberto de caveiras de gesso, flores, velas, cruzes, recipientes. Uma semana depois reparou em pichações na parede de uma rua próxima, o desenho estilizado de uma criatura, de cabeça enorme de caveira, corpo longo, pés largos e mãos longas! Embaixo havia escrito: NECROI VIVE!