O Enfermeiro

por Mundo Sombrio
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No largo corredor de paredes brancas passavam pessoas apressadas e atarefadas. Os jalecos monocromáticos esvoaçavam por todos os lados a cada rápida passagem de seus usuários. Enfermeiras empurravam macas ou cadeiras de roda em um vai e vem interminável. Enfermeiros carregavam bandejas cheias de seringas e ampolas. Não há tempo a perder, muitas vidas estão mas mãos desses profissionais da saúde e cada minuto conta.

Antônio estava em seu primeiro plantão. Também é seu primeiro dia de trabalho. Sentia-se deslocado e constrangido por não saber o que fazer. Precisava a todo momento perguntar à enfermeira chefe qual era sua próxima tarefa. Seus colegas, há mais tempo no serviço, não paravam nem um minuto e sabiam exatamente quais eram as múltiplas funções a desempenhar. O Enfermeiro Antônio olhou para o relógio e respirou aliviado. Faltavam apenas dez minutos para terminar seu plantão. Já estava retirando o jaleco e se dirigindo para o vestiário quando a enfermeira chefe o chamou:

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– Pode nos fazer um favor Antônio? Perguntou meio a um sorriso amarelo. Sem esperar resposta continua:

– Estamos com pouco pessoal hoje. Um bebezinho de seis meses acaba de falecer. Pode levar o corpo ao necrotério antes de ir? Ele está na enfermaria dezessete. Obrigada.

Então virou as costas e saiu apessada para mais alguma tarefa inadiável.

Antônio estava apreensivo porque pensou que a chefe iria pedir-lhe para ultrapassar seu horário, mas ficou tranquilo porque ela lhe pediu apenas um único favor.

O rapaz entrou na enfermaria e parou na porta. O cenário era desolador. A sala vazia ostentava apenas uma maca no centro. Sobre ela existia um colchão nu, revestido em corvim, sem roupa de cama. O corpo do bebê bastante pálido, jazia sob uma luz difusa que escapava entre as persianas.

Antônio encheu os olhos de água. Aquela criança parecia apenas estar dormindo e seu primeiro impulso foi de cobri-la com um cobertor.

Apanhou-a no colo e se encaminhou para a sala dos mortos. Foi com dificuldade que o enfermeiro deixou aquele pequeno corpo nu e sem vida sobre a mesa fria de metal no necrotério. Enfim Antônio foi para casa descansar de sua exaustiva ocupação.

Um banho refrescante e roupas leves fizeram o enfermeiro se sentir refeito.

Após uma refeição rápida, procurou o leito e dormiu. Não havia passado uma hora em que Antônio estava no seu benfazejo repouso, quando foi acordado por um choro. Assustado, pulou da cama. Não era um choro comum, era um choro muito alto.

O rapaz correu para acender a luz pois um bebê estava chorando em seu quarto. Tudo se iluminou e Antônio ficou apavorado, não tinha ninguém ali. Porém ainda ouvia o choro da criança. Estava baixo e parecia vir de trás da parede, do outro cômodo da casa. O Enfermeiro estava pálido de susto, mas reuniu forças e foi até a sala procurar a origem daquele som. Revirou toda a casa e não encontrou nada. Mas aquele choro estridente estava lhe enlouquecendo. A cada ambiente que entrava, parecia que o choro estava em outro lugar.

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O Enfermeiro não aguentava mais e saiu correndo de seu apartamento. Porém o choro estava mais alto e ecoava dentro da sua cabeça. Resolveu voltar ao hospital. Deu a desculpa na portaria de que esquecera sua carteira e entrou. Desceu as escadas direto para o necrotério. Olhou pela abertura de vidro da porta. Tudo escuro. Apreensivo, o enfermeiro abriu a porta, acendeu a luz, mas não viu nada. O bebê não estava mais ali. Certamente já encaminharam o corpo.

O choro cessou e Antônio imaginou que estava enlouquecendo. A causa de tudo isso deve ser porque ficou impressionado com a morte daquele bebê. O Enfermeiro entrou no carro cansado. Olhou seu reflexo no retrovisor e percebeu que olheiras se formaram em volta dos seus olhos. Percebeu também que atrás dele, sobre seus ombros, estava o bebê com a pele esverdeada, olhos roxos e coberto de sangue. Novamente inicia o som agudo e incessante do choro infantil nos ouvidos do enfermeiro, que fica ali, estático e com um olhar perdido.

Quando o encontraram naquele torpor o encaminharam ao sanatório e ali o enfermeiro permanece até hoje, trancado em um quarto, com uma feição inexpressiva e o olhar fixo na parede.


ESCRITO POR: Aldo Almeida

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