Alguém disse uma vez que o que faz um ser humano é a sua infância. Que essa fase na vida marca e decide definitivamente o que seremos para o resto da vida. Quando penso no passado, quando iniciava essa vida, eu recordo bastante de Dona Rosa.
Ela sempre esteve presente na minha vida pelo que sei e ao que parecia, havia sido babá de minha mãe e seus irmãos. Tinha sido tomada sob a proteção do meu avô e acumulava o cargo de governanta, babá, conselheira e guardiã da família, agora assistia, meus primos, irmãos e a mim.
Eu era um garoto frágil, de cadeiras de rodas, que mal deixava o quarto, ficava por ali, quieto, enquanto os outros meninos corriam em volta da varanda da casa, subiam nas goiabeiras e brincavam de esconder. Sempre ficava olhando meus primos e irmãos se divertindo ruidosamente enquanto eu ficava para trás, sozinho com meus pensamentos naquela casa enorme, antiga e cheia de recordações. Acho até que um dia todos esqueceram de mim, inclusive meus pais. Eu me sentia vivendo numa bruma de sonhos.
Então, os outros passaram a me ignorar, fugir de mim. Mas Dona Rosa não. Ela fazia questão de juntar os moleques no quarto e contar histórias de terror para todos nós. Demostrava claramente que conhecia o mundo sombrio de fantasmas e monstros e que via coisas que em geral as pessoas não podiam enxergar.
Dona Rosa narrava histórias de almas penadas que transitavam na rua do hospital e surgiam para transeuntes desavisados que tremiam de pavor e nunca suspeitavam que aqueles mortos recentes estavam apenas deslocados. Mas claro, advertia Dona Rosa, havia também os maus espíritos.
Alma de gente ruim presa entre os mundos. Aliás, para se ficar preso entre mortos e vivos, explicava ela, era necessário ter algum apego à vida que não deixava o espírito partir.
Dona Rosa também dissertava sobre demonologia numa lista e esclarecimentos que pareciam não ter fim. Dizia que, desde pequena, via o outro lado. Um mundo de duendes, entidades, almas e diabos que só podiam ser vistos por algumas pessoas.
Ela colecionava inúmeros relatos com finais felizes, outros nem tanto, e sempre fazia advertências para a prática do bem e do respeito, além de resignação diante da vida. Censurava as paixões, citando exemplos em suas histórias sobre gente leviana e passional que não se dava bem no fim.
Aquela mulher contava suas histórias para todos, mas eram sobretudo, nós as crianças, os mais interessados e, dentre eles, eu, o que mais gostava de ouvi-la. Dona Rosa foi de suma importância para mim. Ainda mais porque me ensinou aspectos da existência que transcendiam a rotina de qualquer criança. Foi com ela que descobri os segredos da vida e da morte, o aspecto do abandono dos meus pais e a indiferença das outras crianças.
Eu estava morto e não sabia. Preso naquele quarto, ainda esperava atenções e observava desejoso meus primos e irmãos. Não podia discernir entre o antes e o depois, nem que não vivia mais. Dona Rosa foi a única que não se espantou comigo ou me ignorou. Antes, me acolheu como um dos vivos e foi me ensinando e me oferecendo carinho para além do mundo dos mortos.
A História de Terror “Dona Rosa” foi escrita por Jorge Raskolnikov
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