A Benzedeira Deolinda. Fredo, era um moço que morava na vila do Suspiro, lá pelos anos 50. Não sabe como, nem se lembra, só sabe que sentiu um comichão nas costas, começou a coçar, era uma bolha cheia d’água. No outro dia amanheceu pior, várias bolhas.
De tardinha, eram mais de trezentas bolhas, coçava, coçava e sua mãe Ernestina perguntou:
– Menino de Deus isso é cobreiro e é de sapo, de aranha ou de cobra. Por onde tu andou?
– Não me lembro, pode ter sido na pescaria, na mangueira, no cercado.
– Menino eu já te disse pra não deixar a roupa no chão, tem bicho que tem veneno e tu pega cobreiro.
No outro dia um vergão dos grandes se alastrava pelas costas, e sua avó Josefa disse:
– Menino de Deus isso é cobreiro dos brabos! Tem duas pontas se alastrando se tu deixar uma ponta tocar na outra tu vai morrer! Meu neto, procura a Dona Deolinda, ela cura isso.
No outro dia, a coceira virou ardência, que virou dor, até a camisa se encostasse causava dores incômodas. Nada podia tocar, ele deitava de bruços, estava ficando insuportável.
– Vó aonde mora a Dona Deolinda? – Perguntou Fredo.
– Olha filho, faz uns vinte anos que eu não vejo ela, mas fica longe, a mais de vinte quilômetros daqui, lá todo mundo conhece ela, é só chegar no sítio da Dona Mercedes que te informam.
A Benzedeira Deolinda
Fredo encilhou o cavalo e se mandou para o Oeste onde ficava o caminho indicado e andou horas até que viu um arvoredo com laranjeiras, limoeiros, galinhas no quintal e um cachorro latindo.
Viu um casebre e fumaça saindo pela chaminé e foi logo gritando:
– Ohhhh de casa! Ohhh de casa!
Nisso, saiu uma velha corcunda . Devia ter mais de cem anos, pensou Fredo. Cabelos desgrenhados, brancos que nem neve, olhar torto e dentes falhos, foi logo dizendo:
– Que te a sucedi menino?
– Procuro a mando da minha vó Josefa a Benzedeira Deolinda!
– Sou eu. Aquela velha tá viva?
– Tá vivinha da silva, dona Deolinda, mas que idade a senhora tem?
– Se não errei as contas, cento de dez, mas tira uns quinze… eheheh. Já vi que o moço tá com “pobrema”, porque quando um moço procura uma velha, só pode ser “pobrema” ou doença ruim.
– Meu caso é coisa séria, tô com cobreiro nas costas.
– Desce guri, vamos vê essa coisa.
Fredo desceu do cavalo e entrou na casa tosca, um fogão com uma chapa de ferro, o resto feito de saibro amarelo, ervas e pedaços de ossos pendurados e uma caveira pendurada sobre a porta.
A velha ofereceu um banquinho.
– Tira a camisa e senta de costa para o lado norte.
Deolinda pegou uma faca bem afiada e, entre as orações, recitava passando o fio da faca sobre as costas sem tocar nas feridas:
– “Ave Maria mãe do menino Deus, olhe esse menino com o mal do cobreiro e me dê a graça de tua força para curar esse andarilho. Recebo a força dos astros do mundo, que vem da cabeça da terra e se faz aqui no aço da faca que vai cortar – Então pegou a faca, fez o sinal da cruz com ela e falou:
– O que eu corto? Cabeça, meio e rabo. – Continuava – O que eu benzo? – Cobreiro brabo, corto no rabo, em nome de Deus e da Virgem Maria. – Repetia três vezes. – Cobreiro brabo, corto na cabeça, em nome de Deus e da Virgem Maria. – a Benzedeira Deolinda Repetia três vezes.
Depois pegava um galho verde de arruda e repetia em forma de cruz repetia três vezes:
– O que eu corto? Cobra, cobrão, aranha, aranhão, sapo, sapão. Corto a cabeça e corto o rabo. ” – E logo passa o galho em toda a ferida e joga fora.
Terminando as orações, a velha pôs a faca no fogão.
– Quanto custa Dona Deolinda? – perguntou o Fredo.
– Custa nada moço, quem cura é Deus eu só sou instrumento. – Respondeu a benzedeira Deolinda.
O menino agradeceu, despediu-se e subiu no cavalo.
Pois no dia seguinte, as bolhas foram secando, o vergão diminuindo, o tal cobreiro minguando e tão logo acabando.
Dentro de três dias estava curado, e a mãe do Fredo disse:
– Vou fazer uns bolinhos de sonho, tu pega teu cavalo e leva prá Dona Deolinda, pois ela te curou menino. Também leva este pedaço de charque e esse pote de sal, leva arroz, feijão e batata doce como paga pela cura.
Prontamente, Fredo pegou todo os presentes colocou numa mala de garupa feita de pano grosso, montou no seu cavalo e trotando, foi indo para a casa da Benzedeira Deolinda, atravessou o banhado, e seguiu o caminho feito anteriormente.
De longe viu a tapera, foi se achegando, se achegando e para sua surpresa quanto mais perto chegava, mais impressionado ficava.
Não tinha nenhum arvoredo, nem as árvores frutíferas que vira antes, a não ser árvores mortas. Nem cachorro e nem galinhas. Tudo se resumia a uma triste tapera sem porta, sem janela e só paredes que nada lembravam o que viu.
Desceu do cavalo e foi entrando na terra. Só lembrança do que ali viveu. Nada tinha, apenas o mistério de tudo que passou, mas reconheceu o fogão de chapa enferrujado, ainda via a caveira e logo adiante pedaços de ossos que estavam pendurados.
Subiu no cavalo e seguiu adiante, queria mais explicações.
Depois de um tempo, viu uma senhora na estrada e perguntou:
– Bom dia, como vai minha senhora?
– Vai se indo, moço, na vida a gente diz que vai tudo bem, porque se reclamar Deus castiga.
– Me diga uma coisa dona. A Benzedeira Deolinda, onde encontro ela?
– No cemitério a uns trezentos metros daqui, mas porque pergunta se a velha já morreu há quinze anos?
– Nada não, porque se eu lhe contar não vai mesmo acreditar.
– Ah, pois é, tem gente que vê ela por aí, sei que a tapera dela é assombrada.
Fredo então seguiu seu caminho e após um tempo, teve uma ideia. Pensou consigo mesmo: “Vou deixar esses presentes lá no cemitério, afinal são pra Dona Deolinda.
Chegando no cemitério, foi se achegando e viu uma idosa com uma moça e um menino rezando no túmulo sem marca com uma cruz.
Perguntou logo:
– Minha senhora, sabe onde fica o túmulo da Benzedeira Deolinda?
– Pois é esse aqui que estou rezando!
– A senhora é parente dela?
– Sim, sou filha, essa é neta e aquele ali o bisneto e vim pedir ajuda, pois tenho passado fome, meu marido faz dois meses que não aparece, foi trabalhar na cidade e não voltou mais.
Fredo então percebeu o enlace do destino.
– Pois sua mãe me mandou te entregar isso.
Fredo foi até o cavalo e deu a ela os mantimentos que trouxera para a Deolinda.
– Mas moço, que Deus te abençoe, mas minha mãe é falecida, como poderia mandar me entregar?
– Pois nem eu sei, minha senhora e é melhor a gente nem tentar entender.
E seguiu sua viagem de retorno para casa.
Por: Silvia Restani
6 comentários
Ameeiii essa história, sou super fá do Mundo Sombrio <3
Obrigado pelo carinho Mari! Continue sempre conosco! Abraços Sombrios!
Eu adorei linda história me lembra aquelas lendas do nordeste!😍😍
Ameeiii essa história, sou super fá do Mundo Sombrio <3
Obrigado pelo carinho Mari! Continue sempre conosco! Abraços Sombrios!
Eu adorei linda história me lembra aquelas lendas do nordeste!😍😍
Comentários fechados.