Em uma época em que o poder religioso confundia-se com o poder real, a “Santa Inquisição”, instituição da Igreja Católica, perseguia, torturava e matava na fogueira – e de muitas outras cruéis e bizarras formas -, milhares de seus “inimigos”, ou quem ela entendesse como inimigo, acusando-os de hereges, por vários séculos.
Numa pequena aldeia espanhola, por volta do século XIII / XIV, vivia o Sr. Gonzales, já um velho homem, conhecido por suas benfeitorias locais.
Bondoso por demais, aquele velho homem ajudava os aldeões sempre que podia com pequenas doações e remédios naturais de ervas e chás que confeccionava.
Ele vivia sozinho em sua humilde casa.
Dores de dente, resfriados, pequenas moléstias e doenças infantis, Sr. Gonzales resolvia.
Ele era considerado “o médico” dos pobres, já que naquele tempo, só a corte tinha acesso à saúde ou a um médico “de verdade”.
Vivia-se tranquilamente naquela aldeia, até aquela primavera com a chegada de um emissário da igreja, o Frei Dom Tomázio e sua comitiva clériga.
Depois de uma longa viagem, alguns componentes da comitiva do religioso, apresentaram-se doentes, indispostos, com quadro de febre alta, dores no estômago, vômito, diarreia e desidratação, o que já levara alguns à morte durante a viagem.
Naquele tempo, o sistema de esgoto era precário e/ou inexistente em determinados lugares, favorecendo assim, doenças infecciosas de vários tipos.
Mais do que imediatamente, Sr Gonzales foi lembrado por um dos aldeões que servia os nobres clérigos de Dom Tomázio, por sua fama de “curandeiro”, palavra esta que em nada agradou o religioso.
Dom Tomázio mandou chamar o homem que, após ouvir as queixas dos doentes e ver os sintomas que os mesmos apresentavam, dirigiu-se para sua casa em companhia de um empregado de Dom Tomázio e passou a preparar uma boa quantidade de um chá de ervas e o empregado do frei, observava a tudo muito atento.
Com a bebeiragem pronta, ofereceu-a aos doentes que, nos dias seguintes, apresentaram pronta melhora.
Dom Tomázio, era muito orgulhoso para agradecer e referiu a recuperação de seus homens à vontade Divina e não à estranha bebeiragem feita por um homem “ignorante”.
O assistente do frei relatou o que viu na casa do Sr Gonzales exagerando na descrição.
Referiu muitos “objetos estranhos, plantas, livros, incensos e até caldeirões…”
Imediatamente, Dom Tomázio ordenou a prisão de Sr Gonzales e o acusou de bruxaria e pacto com o demônio.
A “Santa Inquisição” levou Sr Gonzales à tortura, obrigando-o a confessar que tinha parte com Lúcifer.
Ele resistia e negava tudo, referindo ser temente a Deus e que só ajudava as pessoas.
Dom Tomázio então pessoalmente o cegou, usando ferros quentes em seus olhos, decepou-lhe as mãos, para que nunca mais preparasse bebeiragens e sua língua para que não pudesse rezar ao diabo e ensinar suas bruxarias proferindo palavras hereges.
Deixaram-no sangrando abandonado na prisão.
Enquanto a comitiva clériga preocupava-se em extrair a confissão do homem que intitulavam bruxo, feiticeiro e satanista sob tortura, ignorava as condições de saúde da aldeia e adjacências.
A doença que trouxeram se espalhou e centenas de pessoas já apresentavam os sintomas.
Viajantes que chegavam a aldeia, disseram que cidades e reinos bem distantes, já estavam acometidas da estranha moléstia.
Vieram então notificar Dom Tomázio da epidemia que se alastrava velozmente e este, lembrou-se, que acabara com a chance da cura da doença.
Somente Sr Gonzales sabia o modo do preparo do antídoto, da bebeiragem que curou seus homens.
“Mas como poderia fazê-lo agora?”
Pensava preocupado já febril, nauseado e com muitas dores no estômago, o religioso…