Na madrugada ele acordou
Muitíssimo assustado
Ao som das gargalhadas infernais
Enquanto o seu nome era bradado
A fogueira ainda queimava sutilmente; próximo a ela havia uma estaca cravada no chão, mantendo fincada na sua extremidade a cabeça de alguém. Após esfregar os olhos abruptamente, ainda deitado no chão rachado da caatinga, o sujeito, que acordara ao som das gargalhadas mortais, não acreditava no que seus olhos estavam vendo; era a cabeça, decapitada e fixada na estaca, ainda viva, sorrindo e clamando o nome de seu algoz, exibindo seus dentes salivantes que brilhavam úmidos ao clarão das chamas; mas antes de prosseguir, contarei desde o início como tudo aconteceu, e apresentarei três sujeitos, três homens em conflito, especialmente esse desafortunado que carregava consigo uma cabeça, na vasta madrugada, prestes a enfrentar terríveis assombros durante sua caminhada noturna.
Ato I: Minha Cabeça Será Sua Herança
“Traga-me a cabeça de Sérgio Santana!” — A ordem foi dada ao cangaceiro Lourinho, um dos mais temidos da região, e também, o mais ganancioso, disposto a praticar qualquer atrocidade em troca de riquezas. Lourinho, o cangaceiro destemido, rapaz bruto que já enfrentou três homens armados usando apenas um caule de cana-de-açúcar, era também um covarde, tendo matado crianças, senhoras e gestantes. Agora, Lourinho recebe ordens de um fazendeiro e, por um punhado de réis, seguirá viagem em busca do ex-cangaceiro chamado Sérgio Santana, que há alguns anos deixou o banditismo ao se apaixonar por uma moça bonita. O fazendeiro afirma que o ex-cangaceiro, Sérgio Santana, ainda possui uma dívida pendente, e após tantos anos a dívida só seria paga tendo em mãos sua cabeça como troféu. Lourinho, que tinha uma rixa com Sérgio Santana, não hesitou em aceitar o serviço de trazer a cabeça do ex-cangaceiro — “Vou, degolo, e volto!” — foram as únicas palavras de Lourinho ao fazendeiro enquanto montava em seu cavalo, descobrindo-se da sombra do telhado da fazenda, indo ao encontro do mormaço que aquecia seu chapéu de couro com formato de meia-lua. Em algumas horas, quando a Lua nefasta macular o céu, Lourinho chegará à cidade onde mora o ex-cangaceiro e será surpreendido por uma tenebrosa surpresa.
Toc-Toc… Batem à porta do meu caixão
Como poderia eu responder estando imerso nessa escuridão?
Quem vem lá furioso, com sede de decapitação?
Retire logo essa tampa, carrasco, e mostre-me o seu facão!
A meia-noite se aproximava, o céu escuro como o breu cobria a cidadezinha, feito um lençol lúgubre; enquanto isso, os galopes do cavalo de Lourinho minimizam-se, parando em frente ao bar, o preferido do cangaceiro. Bastou apenas um gole de cachaça e logo Lourinho montava em seu cavalo novamente, cavalgando ligeiro, rumo ao cemitério, após receber a notícia de que Sérgio Santana “bateu as botas” e era sepultado naquele exato momento. Indiferente com o fato de um enterro à noite, o cangaceiro segue veloz pela estradinha de terra, de encontro marcado com o defunto e seu novo lar. Lourinho, com dificuldade, forçava seu cavalo a subir o morro íngreme que dava acesso aos fundos do cemitério; o bicho relinchava aos escorregões, quase desistindo da subida, só que a quantidade de açoites era tão absurda que o cavalo, não suportando mais o flagelo, ferozmente esforçou-se até chegar ao topo. Lourinho desce do cavalo e caminha pelo jardim de cruzes, esconde-se atrás dos galhos secos de uma árvore, sob o luar efêmero, e observa algumas pessoas deixando o local onde Sérgio Santana permanecia em sono perpétuo. No exato momento que a última pessoa deixou o local, Lourinho foi de encontro à cova, verificou o nome de Sérgio Santana riscado na madeira e, esfregando as mãos uma na outra, sorrindo de tanta felicidade, repetia para si como era dotado de sorte, já que não precisaria travar duelo com Sérgio Santana – que era um exímio atirador – bastava, apenas, cavar e arrancar sua cabeça, levar para o fazendeiro e receber sua recompensa.
A cova era rasa, e com as próprias mãos, Lourinho espalhava a terra abrindo passagem até encontrar o caixote fúnebre. Coberto de ansiedade, freneticamente ele puxava a tampa do caixão, mantendo um de seus pés na cova, que não era nada funda, e o outro pisando na parte mais elevada do amontoado de terra. Após abrir o caixão, ele sai da cova dando um passo para trás, arremessa a tampa para o lado e permanece em pé, em frente ao buraco onde o defunto estava enterrado — Bang! Bang! — Lourinho é atingido por dois balaços; um tiro no pescoço e outro direto no seu coração; o sangue esguicha da jugular enquanto o cangaceiro cai em cima da cova vizinha, colorindo a terra funesta de um vermelho intenso. Do caixão um ser se levanta, sem nenhuma pressa, dá alguns passos até o corpo de Lourinho e verifica se o recente defunto baleado é, de fato, um defunto mesmo. O ser que brotou da cova guarda seu revólver, em seguida, retira de dentro do caixão onde estava enterrado um facão muito afiado, perfeito para separar a cabeça de Lourinho do restante do corpo. Terminado o trabalho de carniceiro, despejando a cabeça de Lourinho num saco, Sérgio Santana, o ex-cangaceiro, deixa o cemitério carregando a cabeça do homem que tinha planos de arrancar a sua também.
Ato II: Era uma Vez na Caatinga
“Traga-me a cabeça do Lourinho!” — A ordem foi dada a Sérgio Santana, um ex-cangaceiro que já foi o maior de todos, mas agora, vive sossegado na lavoura ao lado de sua mulher. O fazendeiro – o trapaceiro! – ofereceu fortuna e proteção em troca da cabeça do Lourinho. Sérgio Santana relutou de início, mas após ouvir o plano do fazendeiro de como ele ceifaria a vida do cangaceiro, que já havia tentado tirar a sua, meses atrás numa briga de bar, o acordo foi fechado e ambos se preparavam para o grande truque. O fazendeiro detalhou seu plano que era o seguinte: Sérgio Santana simularia sua própria morte, um falso funeral e um enterro de mentira, fazendo com que todos da cidade acreditassem no seu finamento; capangas do fazendeiro seriam os responsáveis por enterrar seu caixão, logo após receberem notícias do bar de que Lourinho já havia chegado na cidade; ao sinal de que Lourinho estaria escondido no cemitério, pronto para exumar seu corpo, os capangas deixariam o local para Sérgio Santana concluir o plano, mantendo seu revólver no jeito, pronto para atirar assim que a tampa de seu caixão fosse aberta.
Começava então os preparativos. Sérgio Santana ajeitou-se no caixão, armado com um revólver e um facão afiadíssimo, tão afiado que poderia levá-lo a óbito em caso de movimentos bruscos dentro da apertada caixa de madeira, que não casava nada com suas medidas — “Tiraram nem as medidas do meu caixão!” — resmungava o ex-cangaceiro que temia agora se tornar um ex-vivo. Após fecharem a tampa do caixão, que embrulhava o desafortunado Sérgio Santana como se fosse presente para os vermes, a carroça seguiu seu rumo para o cemitério, carregando o pseudo cadáver na traseira. A rua de terra esburacada sambava as rodas da carroça, deixando Sérgio Santana em estado de tensão, no escuro, com o facão balançando a cada tranco, indo em direção ao seu pescoço; se porventura a carroça balançasse de forma bruta ao passar por um buraco maior, o estrago seria irreversível, transformando Sérgio Santana num autêntico defunto.
Tudo ocorreu bem durante a subida pela catastrófica estradinha; no cemitério, assentaram o caixão na cova e aguardaram o sinal. Minutos depois, dentro da sepultura, Sérgio Santana ouvia o som da terra batendo em cima do seu caixão. Com firmeza, ele segurava seu revólver dentro do acanhado ataúde de madeira, pronto para disparar assim que retirassem a tampa do seu leito de morte. Chega então o momento em que Lourinho abre a tampa do caixão, e Sérgio Santana, ainda eficiente no gatilho, dispara dois tiros ao observar a silhueta obscura parada em pé, em frente a sua cova, usando um chapéu de meia-lua. Logo após o balaço, Sérgio Santana levanta da tumba, agarra seu facão, se aproxima do finado Lourinho e desliza a lâmina afiada pelo seu pescoço, onde o sangue em profusão ainda esguichava do buraco que a bala fez. Agora, com a cabeça de Lourinho no saco, bastava então seguir caminho pelas árvores secas e cactos espinhosos da noturna caatinga, local onde Sérgio Santana presenciou alguns dos maiores assombros daquela região.
Que diabruras são essas,
Que hesitam os passos meus?
O solo fúnebre da caatinga percorro
Clamando o nome de Deus
Empunho em minhas mãos,
O meu revólver e o meu facão
De onde vens tais demônios,
Assombrar o meu sertão?
Já passava da meia-noite e, Sérgio Santana, não tendo encontrado um cavalo nas redondezas do cemitério, fraquejava entre os arbustos sinistros, a pé, já que o cavalo de Lourinho fugiu de susto após os disparos do revólver. Aos passos cansados, ele caminhava rumo à fazenda, passando antes pela caatinga. O brilho da Lua naquele momento resplandecia mais, tornando a viagem menos dificultosa para o ex-cangaceiro que, de longe, enxergava os cactos e as árvores de pouca folhagem como vultos medonhos; antes fosse só isso, apresentando-se para os seus olhos, mas não; alguns passos à frente uma silhueta tornava-se nítida conforme ele se aproximava; era um homem sentado, muito magro, despido, segurando em seus braços uma criança, raquítica também, manifestando a sua fome. Sérgio Santana explorou os bolsos em busca de alimento, mas nada encontrou, e sem dizer nada ao faminto, sua jornada continuou. Precavido, o ex-cangaceiro virou suas sandálias ao contrário, tencionando despistar os ajudantes de Lourinho, caso fosse seguido, fazendo com que eles perseguissem suas pegadas na direção oposta.
Minutos depois, quase tombando de sono, Sérgio Santana acendeu uma fogueira devido a fria corrente de ar que se alastrou pelo local, deitou-se no chão para descansar as pernas e adormeceu, instantaneamente. Não demora muito e ele acorda ao som de algo se arrastando pelo chão. Guiando o olhar em direção ao barulho, o ex-cangaceiro permaneceu perplexo, tentando entender como poderia a cabeça de Lourinho ter rolado alguns centímetros para fora do saco. Sérgio Santana, mesmo cético, arranjou uma estaca e cravou-a no chão, metendo em sua extremidade a cabeça de Lourinho, impedindo-a de tentar fugir novamente, pensando nas histórias dos antigos amigos do cangaço que relataram locais assombrados pela caatinga. Destemido, ele se prepara para mais um cochilo antes de prosseguir viagem, esticando-se no solo poeirento, mantendo o olhar sonolento fixado na cabeça de Lourinho, fincada na estaca, onde queimava ao lado a pequena fogueira fumacenta. Lentamente, a visão do ex-cangaceiro ficava embaçada, e, enquanto o sono vinha vindo, as trevas também iam surgindo.
“Sérgio Santana! Sé.. Sérgio… Satanás! Ah! Ah! Ah!” — A voz maléfica despertou o ex-cangaceiro, berrando seu nome sistematicamente. Bem devagar, Sérgio Santana se levanta e caminha em direção a cabeça de Lourinho, que gritava seu nome com entusiasmo, fazendo trocadilhos com seu sobrenome chamando-o de Sérgio Satanás. A cabeça decapitada deixava transparecer uma fisionomia demoníaca, sorrindo em tom de deboche, arregalando os olhos e deslizando sua língua para fora da boca, que aparentava ser muito maior do que o normal, salivando enquanto grunhia assustadoramente. Sérgio Santana suplicava à cabeça que ela se calasse, mas ela continuava, aos berros — “Sérgio Satanás! Sérgio Satanás! Viemos te buscar! Viemos te buscar!” — Enlouquecido e abalado, com as pernas já ficando bambas, o sujeito arrancou a cabeça da estaca pelos cabelos e, furioso, botou a desgraçada dentro do saco novamente.
A passos largos, Sérgio Santana ansiava desaparecer daquela caatinga o mais depressa possível, mas, a madrugada sombria, que gozava a atmosfera do inferno, reservava mais obstáculos ao pobre infeliz. Após andar um bocado, agarrando com firmeza o saco com a cabeça de Lourinho, de onde vinham os resmungos e gargalhadas em tons abafados, Sérgio Santana para e contempla mais um vulto, idêntico ao que ele tinha visto anteriormente; era o mesmo homem, sentado, entretanto agora, de costas para o ex-cangaceiro, aparentemente segurando nos braços o seu filho, ou, o que sobrou dele; ao se aproximar, Sérgio Santana é tomado por um arrepio quando nota, nos braços do homem, apenas alguns pedaços da criança que ele mesmo devorou para saciar a sua fome – o pai que devora o próprio filho, já retratado antigamente em Pinturas Negras, concretizava-se agora diante de Sérgio Santana. A ânsia de vômito fez Sérgio Santana cambalear enquanto corria, tatuando feridas em sua carne enquanto esbarrava nos cactos espinhosos, que pareciam ter vida própria, vindo ao encontro do seu corpo misteriosamente.
Não bastasse tudo isso, uma neblina começava a tomar forma, transformando o escuro da noite num clarão funéreo. Imóvel e com dificuldade de enxergar a bruma que cobria seus olhos, Sérgio Santana desnorteou, não sabendo para qual lado seguir, até que, a voz do homem nu, rouca e melancolicamente detestável, proferia o quão faminto ele estava; pouco a pouco a voz se aproximava, e o som de seu corpo esquelético, arrastando-se pela poeira, anunciava que ele poderia surgir de qualquer lugar naquele nevoeiro. Sérgio Santana movimentou-se para todas as direções possíveis, apontando seu revólver com o dedo trêmulo, pronto para disparar. De repente sucede-se o silêncio, e o ex-cangaceiro reza pela primeira vez em toda sua vida. Um vapor quente começa a bolinar a nuca de Sérgio Santana, subindo até seu ouvido esquerdo, ficando cada vez mais aquecido, e então, uma voz execrável murmura martelando bem no seu tímpano — “Tenho fome!” — Feito louco e arrepiado, o ex-cangaceiro dotado de perseverança dá no pé, correndo para qualquer direção. Alivia-se quando encontra um cavalo, aparentemente também desnorteado pelo glacial nevoeiro; Sérgio Santana apalpa o bicho e se prepara para montar, desistindo logo em seguida ao perceber que o animal não tinha cabeça; era um cavalo decapitado, que galopava normalmente, emitindo sons de relincho que vinham do rombo abismal em seu pescoço. Infausto Sérgio Santana, à beira da loucura, caminha de costas se distanciando do cavalo sem cabeça até escorar-se num cacto, possibilitado de enxergar apenas seus pés em meio ao clarão nebulento, pés que agora eram agarrados por mãos pútridas que brotavam do chão, forçando o ex-cangaceiro a mergulhar, pelas terras da caatinga, direto ao inferno.
Ato III – Final: Eu e o Diabo na Terra do Luar
Chamaste-me? Eu vim!
Apazigue o bater do coração
Sob o luar aqui estou,
Mas careço de tua devoção
Achas quente o calor da caatinga?
O que dizer do inferno, então?
Na penumbra, o único som possível era os passos que trituravam os pedregulhos da estrada de terra. A noite era tão quente que era possível acreditar que o Sol fantasiou-se de Lua, aquecendo a terra durante o luar do sertão. O sujeito que caminhava tarde da noite, na estrada de mau agouro, vez ou outra olhava de soslaio, incrédulo com a obscura fumaça que o seguia. Os arbustos que acompanhavam a estradinha movimentavam-se, passando a impressão de que algum animal, ou coisa pior, fosse saltar de lá; e o vento, que soprava nas costas do homem, trazia um aroma amargo que mais tarde poluiria a noite com cheiro de enxofre. Uma voz trovejante, vindo de algum canto oculto, pede para o caminhante noturno parar, e ele para, temeroso, e ao se virar, se depara com a fumaça escura que o seguia, no meio da estrada carecida de iluminação; a fumaça dançante movia-se freneticamente, logo transformando-se num homem vestido de preto, aparentemente sem face.
Sem cerimônia, tal homem bizarro pergunta ao caminhante — “Se eu te dissesse que você tem apenas mais um dia de vida; o que você faria?” — Com a voz trêmula, o homem amedrontado responde que faria dezenas de coisas, detalhando cada uma delas, que aproveitaria ao máximo suas últimas vinte e quatro horas; não contente com a resposta, o misterioso homem que surgiu da fumaça pergunta, mais uma vez — “E se eu te dissesse que você viveria até os seus oitenta e nove anos; o que você faria?” — O homem, já menos assustado, pensa, pensa mais um pouco, e responde que não saberia ao certo o que ele faria, e termina com um simples “Sei lá, muita coisa!”. O vulto negro e opaco aproxima-se mais um pouco e começa a esbravejar — “È exatamente isso que eu acho engraçado em vocês; sabendo do fim de sua existência, pensam logo em tudo que gostariam de fazer, como se pudessem recuperar o tempo perdido; mas, sabendo que poderiam viver ainda por muitas décadas, com tempo suficiente para fazer de tudo, estagnam-se, e não fazem, absolutamente, nada!” — Ao ouvir as palavras que ecoavam como trovão, o homem reflete e pondera que foi uma péssima ideia se envolver com forças ocultas, tendo agendado um encontro com o Diabo naquela estrada.
A ambição, em sincronia com a infelicidade, o fez recorrer a esses meios mórbidos. O Diabo, astuto, não deu outra opção ao homem que, temendo que sua vida infeliz poderia acabar em breve, fechou acordo com o coisa ruim, que prometeu riqueza, poder e respeito, mas deixou uma coisa bem clara antes de desaparecer — “Desfrute bem de tudo que lhe ofereço, mas lembre-se que, um dia, talvez daqui a alguns anos, ou, talvez no próximo século que se aproxima, eu voltarei para cobrar essa dívida; esteja preparado, ou ofereça-me muito mais do que foi oferecido aqui nesta noite!”
Em julho daquele mesmo ano, a primeira sessão de cinema era exibida, no Rio de Janeiro; em novembro, iniciou-se a Guerra de Canudos; já os terríveis acontecimentos ocorridos na caatinga, durante esse mesmo período, permaneceram ocultos do resto da população. Na caatinga, onde jazia enterrado Sérgio Santana, até o pescoço, desfalecido ao lado do saco que armazenava a cabeça de Lourinho, o fazendeiro se aproxima após descer do cavalo, agarra o seu facão e vai ao encontro da cabeça de Sérgio Santana, exposta sobre o solo, com o resto do corpo enterrado. Dois golpes da lâmina afiada foram suficientes para desunir a cabeça do ex-cangaceiro do resto de seu corpo, que permaneceu sepultado no fundo daquele território assombrado e poeirento. Dentro do saco, que agora balançava durante os galopes, a cabeça de Lourinho e a de Sérgio Santana trombavam-se uma na outra, enquanto o fazendeiro dava as ordens para o cavalo ir mais depressa, deixando para trás, durante a aurora, um rastro de poeira enquanto seguia seu rumo para a velha estrada sinistra, onde uma obscura fumaça negra se formava, aguardando a sua chegada.