Todas as noites, você fica sentado no conforto e segurança de sua casa, mas não faz ideia do que está acontecendo lá fora na escuridão. Não muito longe de sua casa, há um lugar escuro. Você pode não saber, mas está lá. Em todo o país, em pequenas vilas e cidades, há muitos desses lugares sombrios.
Quando eu era jovem, morava em uma cidade pequena. Johnny Craig morava do outro lado da minha rua. Eu era amigo de seu irmão mais velho. Ele era apenas um bebê na época. Eu o vi crescendo, mas nunca parei pra prestar atenção nele.
Às vezes, durante a noite, minha mãe pedia que eu fosse à loja de conveniência do bairro para comprar uma caixa de leite ou um saco de açúcar. No caminho para a loja, tive que passar por uma longa estrada escura.
Durante o dia, era apenas um lugar sombreado, com árvores velhas e retorcidas ao seu redor e terrenos baldios onde nada tinha sido construído e nada seria construído. Eu nunca tive medo dali durante o dia mas, à noite… era um lugar diferente. Um lugar solitário. Um lugar sombrio e de coisas estranhas. Um lugar de terror e medo.
Não havia casas ali por perto. Estava escuro como breu, pois também não tinham postes de luz. Era tudo tão escuro quanto escuro dava pra ser. Escuro como a noite mais profunda. As árvores altas bloqueavam a lua e as estrelas, lançando suas longas sombras pela estrada.
Sempre que você tinha que seguir esse caminho, andava cada vez mais devagar. Era como entrar em um túnel escuro. Atrás de você estavam as luzes das casas, o som de carros e pessoas caminhando pela calçada. À sua frente, havia apenas um longo e solitário trecho de escuridão no qual qualquer coisa poderia estar à espreita, qualquer coisa mesmo.
Toda vez que eu tinha que passar por aquele lugar à noite, eu ficava com muito medo. Eu esperava que alguém aparecesse, para não ter que andar sozinho, mas nunca apareceu ninguém. Enquanto caminhava por aquele trecho escuro da estrada, eu mantinha meus olhos fixos nas árvores, esperando ver algo ou alguém à espreita na escuridão.
Talvez fosse o bicho-papão. Minha mãe costumava me contar sobre o bicho-papão e como ele esperava em lugares escuros por meninos e meninas que se desviavam do caminho. Talvez fosse um predador infantil. Minha mãe também me alertou sobre homens maus que tentavam atrair crianças com a promessa de doces e cachorrinhos. Talvez fosse outra coisa. Algo pior.
Pelo canto do olho, vislumbrava figuras deformadas agachando-se ali no escuro, esperando o momento em que elas avançariam e me atacariam. Então, naquela área silenciosa e isolada, eles começariam a me rasga e a fazer coisas indescritíveis, e ninguém jamais me veria novamente.
Não sei o que esperava ver à espreita naquele lugar durante à noite. Minha imaginação sempre me superou. Na minha opinião, era uma criatura horrenda, em algum lugar entre o animal e o homem. Tinha membros longos e finos e garras enormes e afiadas. Tinha a pele úmida e viscosa e os olhos que ardiam como fogo. Imaginei-o escondido nos galhos daquelas árvores velhas, caindo sem barulho e perseguindo os meninos e meninas incautos que passavam pela estrada escura à noite.
Uma noite, quase me pegou. Eu estava andando por aquela estrada escura e, de repente, não havia nenhuma luz à frente. Foi quando eu soube que estava chegando. Eu podia sentir isso esperando lá na escuridão. Comecei a correr desesperado para fugir, mas eu podia sentir aquilo atrás de mim. Estava se aproximando rapidamente. Eu podia sentir sua respiração na parte de trás do meu pescoço. Eu corri. Eu corri o mais rápido que pude. Eu corri até pensar que meu coração iria explodir.
Ele quase me pegou com suas garras, mas eu consegui fugir. Quando voltei para a segurança da minha casa, me olhei no espelho e vi um rasgo longo e irregular na parte de trás da minha camisa, como se uma garra afiada tivesse tentado me agarrar. Isso me assustou muito, e depois desse ocorrido, eu passei a odiar aquela estrada e a evita-la a todo o custo, mais do que nunca.
“Uma noite eu não voltarei”, avisei minha mãe.
Ela apenas riu e me disse para não ser boba.
“Há algo lá fora no escuro”, eu disse à ela.
“Não há nada no escuro que não exista na luz”, ela me garantiu.
Na verdade, o que os adultos sabem sobre o mundo? Os adultos acham que sabem tudo. Eles confiam no que leem, mas apenas leem o que é relatado nos jornais e na TV. Eles dirigem seus carros e nunca precisam andar em lugar nenhum à noite. Eles não sabem o que acontece lá fora, no escuro, nos lugares miseráveis e solitários, onde nenhuma luz brilha, onde a escuridão paira como uma nuvem no chão e nenhum pássaro canta.
Eu sabia que eles não acreditariam em mim. Eu sabia que não havia nada que eu dissesse que pudesse convencê-los de que algo ou alguém morava lá entre as árvores, naquele trecho escuro da estrada.
À medida que fui envelhecendo, fui me esquecendo daquela estrada escura. Fiquei mais alto, fui para o ensino médio, comecei a jogar futebol, aprendi a dirigir e comecei a namorar garotas.
Os anos se passaram e, de alguma maneira, eu esqueci da coisa que espreitava lá na escuridão. A lembrança ainda permanecia em um canto distante da minha mente, mas era uma lembrança trancada na infância.
Mais anos se passaram, e eu nunca pensei nas outras crianças que tinham que andar naquela estrada escura à noite.
Três dias atrás, Johnny Craig desapareceu. Ele morava do outro lado da estrada. Eu era amigo de seu irmão mais velho. Eu o vi crescendo, mas nunca prestei muita atenção nele. Não até ele desaparecer.
Eles o encontraram nas árvores naquele trecho escuro e solitário da estrada. Seu corpo estava rasgado, rasgado e esmagado, quase irreconhecível. A polícia disse que ele foi atacado por algum tipo de animal.
No momento em que recebi a notícia, eu já sabia o que tinha de fato acontecido; Johnny Craig foi sido assassinado pela coisa que meus medos de infância haviam criado. A coisa que eu conjurei na minha imaginação. Eu deixei aquela coisa naquela estrada escura. Eu a tinha deixado lá para esperar por um garotinho assustado que estivesse caminhando para casa em uma noite escura, um garotinho que não conseguiria correr mais rápido do que eu.
Depois disso, a cidade cortou as árvores e colocou luzes na estrada. Esse trecho da rua não é mais escuro. Agora, a coisa que espreitava por lá se foi. Foi para outro lugar. Onde as pessoas não suspeitam. Foi para outra cidade pequena. Uma cidade pequena como a sua, onde esperará novamente, do mesmo jeito que aconteceu aqui. Esperará que outro menino ou menina assustada apareça. É só uma questão de tempo…